Os Desafios da Transição Energética para o Mercado de Trabalho: UE e EUA
As políticas para a transição energética trazem consigo desafios, nomeadamente através de profundas alterações sociais e económicas. Um sector que não está imune a essas alterações, é o mercado de trabalho. Como irá o mercado de trabalho reagir ao conjunto de reformas com vista á transição energética? Vamos analisar o cenário actual, com especial foco no mercado dos Estados Unidos, Europa, e um panorama geral no mundo.
A transição energética transformará o mercado de trabalho, tornará empregos obsoletos e criará novos empregos. Quantos empregos podem ser perdidos, quantos novos empregos podem surgir, quais os desafios que o processo de transição apresenta?
Segundo um estudo da Agência Internacional de Energia, as políticas de transição energética, ao nível global, vão gerar um saldo de emprego positivo.
Legenda: Balanço entre novos empregos e empregos destruídos perante as políticas de transição energética. A amarelo APS, remete para o efeito até 2030, se todas as políticas forem executadas. A verde NZE, remete para o efeito até 2050, se todas as políticas forem executadas e for alcançado o objectivo Net-Zero. Fonte: (Agência Internacional de Energia).
Perante estes dados, é possível para já, desmistificar a ideia de que a transição energética poderia criar um choque negativo no mercado de trabalho. No entanto, nenhuma transição acontece sem desafios.
O cenário nos Estados Unidos:
Legenda: Densidade de emprego com elevados índices de emissões, por região EUA. (Fonte: MIT)
O estudo revela que, as regiões mais afectadas serão aquelas com elevado volume de operações intensivas de perfuração e mineração de combustíveis fósseis. No entanto, o estudo também mede como áreas com forte peso do sector industrial,, poderão também sofrer mudanças e perda de emprego.
Para apoiar a transição energética, o Congresso americano fez passar a Lei da Redução da Inflação. A lei prevê créditos fiscais alargados para projectos económicos localizados em áreas denominadas como “comunidades energéticas”, que são no fundo, locais com elevado emprego na indústria de combustíveis fósseis, ou com elevado volume de negócio nesse sector e elevado desemprego, e áreas com actividades como minas de carvão, ou centrais de energia que tenham sido recentemente fechadas ou cuja actividade tenha sido reduzida.
Já quando analisados apenas os empregos directamente ligados ao petróleo e ao gás nos Estados Unidos, estes totalizam um milhão de empregos, sendo que 60% desses empregos, caracterizam-se, por reunir um conjunto de competências dificilmente transferíveis para outros empregos existentes, e logo é considerada mão-de-obra com de mais dificil absorção no restante mercado laboral. No entanto, a dimensão da perda do tecido de emprego ligado á industria do petróleo e gás, não parece ser significativa.
Legenda: Percentagem de empregos no sector do petróleo e gás face ao número total de empregos nos Estados Unidos. Fonte: (Boreau of Labor Statistics).
Legenda: Projeção de empregos perdidos anualmente pela industria fóssil e gás, em comparação com os empregos perdidos por ano, na indústria transformadora e serviços comerciais dependentes, durante os anos de 2000-2010. Fonte: (Boreau of Labor Statistics).
A perda anual de postos de trabalho na indústria transformadora entre 2000 e 2010 foi quase 12 vezes superior à perda de empregos prevista nas indústrias do petróleo e do gás, caso os postos de trabalho sejam gradualmente eliminados ao longo de 20 anos. Se utilizarmos a taxa de perda de empregos com competências intransferíveis como base de comparação, a taxa anual de perda de empregos na indústria transformadora entre 2000-2010, foi quase 20 vezes superior.
Até 2030, prevê-se que a nova economia verde, criada pelas políticas de transição energética, venha a sofrer de escassez de mão-de-obra, de pelo menos 1,5 milhões de trabalhadores nos Estados Unidos. As políticas de formação e de melhoria de competências serão cruciais para responder a essas necessidades, mas não serão suficientes:
- Em primeiro lugar, existe um desfasamento geográfico: os novos empregos não estarão necessariamente localizados nos mesmos locais que os empregos antigos, e o recurso mão-de-obra é um recurso dificil de mover.
- Em segundo lugar, é provável que haja uma inadequação de competências: muitos empregos Brown no setor da energia são altamente qualificados e bem remunerados, enquanto que os novos empregos Green são frequentemente menos qualificados e mal remunerados, limitando a mobilidade intersectorial.
- Em terceiro lugar, existe um desfasamento temporal: os sectores Green deverão crescer exponencialmente nas próximas décadas; sendo que a força de trabalho empregada no sector dos combustíveis fósseis não diminuirá ao mesmo ritmo, dificultando a transição.
- Em quarto lugar, existe uma inadequação de género: a maioria da mão-de-obra contratada para estes sectores tem sido quase toda masculina e, até que o mercado seja alargado, o conjunto de potenciais trabalhadores será limitado.
O cenário na União Europeia:
A análise Europeia, divide o mercado em três, os empregos ligados a actividades de poluição intensiva, como mineração\extração, indústria e agricultura (Brown), os empregos verdes, fortemente ligados ás novas tecnologias de energia (Green), e os empregos neutros, onde não se perspectivam alterações relevantes, que correspondem á grande maioria dos empregos na região (Brancos).
Legenda: Actividades mais poluentes na UE. Fonte: (Comissão Europeia).Legenda: Percentagem de emprego em sectores poluentes (Brown) por Estado membro UE. Fonte: (Comissão Europeia).
O emprego em actividades mais poluentes ronda valores na ordem dos 3-10% do emprego total na maioria dos Estados-Membros. Os Estados-Membros, com percentagens mais elevadas são a Bulgária (11%), Croácia, Polónia, Grécia e Roménia (16%). Foram observadas reduções substanciais nestas atividades ao longo do tempo, particularmente na Roménia e Portugal. De longe, a maior contribuição para este declínio veio do emprego nos sectores da agricultura e pecuária.
O relatório sobre a transição energética e o seu impacto no mercado de trabalho emite algumas das seguintes considerações:
- No total, o número de empregos que serão perdidos, em actividades com elevadas emissões e que revelam dificuldade de reabsorção no mercado de trabalho, é relativamente pequeno.
Compreender melhor, quais os grupos e regiões que serão particularmente afectados, é importante, de forma a melhor direcionar as políticas publicas de emprego, direcionando-as para regiões, faixas etárias e sectores, com maiores necessidades de adaptação. - Para facilitar a transição verde, é necessário um investimento eficaz na educação, formação e habilitações da força de trabalho.
- Muitos trabalhadores que já se encontram no mercado de trabalho poderão necessitar de melhorar as suas competências, com vista á adopção de práticas mais respeitadoras do ambiente e abandonar os empregos mais poluentes.
- Para os trabalhadores que venham a perder o emprego, devem existir sistemas de proteção social inclusivos para ajudar a suavização a perda de rendimentos, juntamente com acesso a formação e apoio à reinserção no mercado de trabalho.
- Finalmente, em matéria de apoio á transição no mercado de trabalho, embora os custos de ajustamento possam ser elevados, não agir será provavelmente mais dispendioso.
No que toca á dimensão da necessidade de mão-de-obra para a transição verde, o Fórum Economico Mundial estima que 18 milhões de pessoas terão de ser requalificadas para que a Europa atinja os seus objectivos climáticos.
Já um recente relatório da McKinsey, afirma que se a União Europeia gerir eficazmente o processo de transição energética, poderá obter um ganho líquido de quase 5 milhões de empregos. Aumento esse que requer profundas mudanças na composição da força de trabalho da Europeia. As suas nossas projecções indicam também que, cerca de 6 milhões de empregos serão eliminados até 2050, incluindo reformas. Durante este período, a transição verde até 2050, poderá resultar na criação de cerca de 11 milhões de empregos: número suficiente para acomodar a mão-de-obra que hoje está afecta a sectores de emissões intensivas e acrescer 5 milhões de novos postos de trabalho.
Concluindo..
Reduzir as emissões líquidas de carbono da Europa e nos Estados Unidos, para zero até 2050, em linha com os planos regionais Europeu e Americano, exigirá certamente um esforço para a requalificação do mercado de trabalho. Tal como, exigirá políticas que acomodem a transformação, para não deixar ninguém para trás, e evitar processos de descredibilização e de alguma resistência á mudança.
Por fim, face aos números apresentados, parece relativamente pacifico admitir que a transição energética não terá impactos significativos nos níveis de desemprego. Pelo contrário, parece ser consensual que em matéria de emprego, o principal desafio será conseguir encontrar no mercado de trabalho, força laboral qualificada suficiente, cuja ausência poderá comprometer as metas do plano, tanto na Europa, como nos Estados Unidos.
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